Redução salarial do servidor federal é inconstitucional, diz professor

O professor Aloizio Medeiros afirmou que a PEC que propõe a redução dos salários dos servidores federais é inconstitucional.

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Publicado em:25/09/2019 às 09:00
Atualizado em:25/09/2019 às 09:00

 

“Em razão do princípio da legalidade não se admite a flexibilização da norma em relação aos agentes públicos, inclusive no tocante aos subsídios. Observe que fruta da construção doutrinária”, relatou Medeiros.

Para cortar gastos, o governo procura alternativas. Conforme dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os cofres públicos gastaram R$725 bilhões em pagamentos de servidores ativos da União, estados e municípios, apenas em 2017.

A Constituição, em seu artigo 169, até permite a demissão de servidores concursados estáveis, desde que outras medidas não forem suficientes para o que os limites de gastos com pessoal sejam cumpridos.

Congresso Nacional avaliará PEC para redução dos salários 
dos servidores federais (Foto: Agência Senado)

 

A Lei de Responsabilidade Fiscal, porém, deu um passo à frente. Ela tornou facultativa a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.

O professor Aloizio Medeiros indica que essa autorização não está expressa no texto constitucional, mas o “entendimento da área econômica era que quem pode mais, pode menos”.

“A PEC diz que se a Constituição permite demitir servidores estáveis – uma medida muito dura – não impediria que, em vez de demissão, os entes da federação simplesmente reduzissem, de forma temporária, a jornada de trabalho, com a respectiva diminuição do salário. O Supremo não acolheu este entendimento”, argumentou o especialista.

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Ajuste nas contas públicas é a justificativa para PEC

No texto da PEC, a redução pode ser adotada temporariamente quando for preciso ajuste nas contas públicas. A meta é fazer com que o Executivo cumpra a chamada “regra de ouro”.

Essa regra proíbe que as despesas de operações de crédito do governo superem as de capital – investimentos e amortização da dívida.

“A redução se soma a algumas outras medidas a serem adotadas, tais como a suspensão dos repasses do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ao BNDES; a diminuição, em pelo menos, 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança e exoneração dos servidores não estáveis; além da interrupção do pagamento do abono salarial no ano subsequente”, explicou Aloizio Medeiros.

O texto da PEC propõe a seguinte alteração na Constituição:

"b) a jornada de trabalho dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional poderá ser reduzida, por até doze meses, com adequação dos vencimentos à nova carga horária, nos termos de ato de Poder e órgãos referidos no art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; (...)

f) será cobrada contribuição previdenciária suplementar de três pontos percentuais, por doze meses, dos servidores ativos, aposentados e pensionistas de que trata o art. 40 da Constituição Federal e dos militares ativos e inativos de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal".

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), revelou a ideia de levar para a redução da jornada e de salário de funcionários públicos em períodos de crise econômica também para a Reforma Administrativa.

Maia disse que a questão poderia ser tratada de forma mais estrutural, no momento em que for apresentada como reforma pelo Executivo. Porém, a PEC já vem recebendo apoio declarado do ministro da Economia, Paulo Guedes, e outros governistas.

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Ministros do STF divergem sobre a redução dos salários

Em agosto de 2019, a maior parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou contra a redução da jornada de trabalho e salário de servidores públicos nos estados e municípios - em julgamento de ação sobre o assunto.

Eles perceberam que a redução temporária fere a Constituição Federal. O julgamento, porém, foi interrompido e não tem data para ser retomado. Até o momento, são seis votos contra a redução dos vencimentos dos servidores quando há crise.

A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, disse que a essa estratégia é constitucional. A mesma posição foi defendida pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli. No entanto, ele apontou que a medida só pode ser tomada após todas as providências previstas na Constituição para situações de crise.

Professor de Direito do
Trabalho, Aloizio Medeiros

Já o ministro Ricardo Lewandowiski teve posição favorável aos servidores federais. Segundo ele, o funcionalismo não pode ser prejudicado em épocas de crise, pois seus salários têm o caráter de verba alimentar.

Para entrar em vigor, a PEC ainda precisa ser discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando aprovado se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

“A tramitação da PEC deve seguir o regimento interno das casas legislativas, sem prejuízo da necessidade da aprovação por 3/5 dos membros de cada casa, passando duas vezes na Câmara e duas vezes no Senado, na mesma forma que vem tramitando a reforma da previdência”, explicou o professor Aloizio.

Professor revela tendência em precarizar o servidor

O especialista em Direito do Trabalho, Aloizio Medeiros, foi crítico ao dizer os servidores públicos são “vítimas de uma política econômica que 'massacra" em seu poder aquisitivo”. Na visão dele, a Reforma Trabalhista ainda não apresentou o aquecimento da economia e geração de empregos, como prometido.

Agora, a estratégia do governo, segundo o professor, é ver no servidor público “mecanismos de controle de gastos à margem do princípio da eficiência”.

“Com efeito, observa-se uma tendência em precarizar progressivamente as carreiras do funcionalismo público, tornando cada dia menos atraente a carreira. Não bastasse ficar refém da falta do reajuste anual , após flexibilizar a estabilidade, precarizar o regime de previdência, agora decide reduzir salário em razão da inconsequente política econômica sempre subtraindo recursos da previdência para "cobrir" os desfalques promovidos das contas públicas”.

Para Medeiros, a redução dos salários do funcionalismo federal não irá frear o crescimento das despesas obrigatórias da União. Eficaz, para ele, seria a redução dos privilégios da classe política.

“Com a redução dos privilégios, corte profundo nos cargos em comissão, verbas de gabinete, nepotismo, redução das despesas com publicidade, parar de custear campanha aos políticos, enfim, destruir as carreiras do serviço público, representa alvejar o princípio da eficiência, promovendo ainda o fim do princípio da impessoalidade, pois só teremos no serviço público cargos em comissão, providos pelos parentes e amigos dos políticos, pois nada haverá de atraente no serviço público”, concluiu Medeiros.