Reforma Administrativa: quais são os 'concursos essenciais'?
O presidente Jair Bolsonaro reconheceu a possibilidade de abertura de "concursos essenciais". Saiba quais áreas podem ser contempladas.
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Publicado em:19/02/2020 às 19:00
Atualizado em:19/02/2020 às 19:00
Segundo discussões na Câmara dos Deputados, concursos federais viraram moeda de troca do governo para a aprovação da Reforma Administrativa no Legislativo. Porém, na última segunda-feira, 17, o presidente Jair Bolsonaro reconheceu a possibilidade de abertura de novas seleções.
No entanto, o presidente disse que as autorizações serão apenas para provimentos ‘essenciais’, para não causar gastos que poderiam inviabilizar o pagamento dos atuais servidores.
“Os concursos públicos, (vamos fazer) só os essenciais. Essa é que é a ideia”, disse à imprensa.
Bolsonaro anunciou que a equipe econômica deve analisar os pedidos de novos concursos que, de fato, sejam necessários para o funcionamento da máquina pública. De acordo com o presidente, as autorizações não devem ser irresponsáveis.
“Tem concursos que foram feitos no passado que nós demos prosseguimento agora, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal. Se tiver necessidade, a gente vai abrir concurso. Mas não podemos ser irresponsáveis, abrir concursos que poderão ser desnecessários”, afirmou.
Alguns órgãos federais sofrem com um déficit grande de servidores, o que acaba afetando o funcionamento de alguns setores da sociedade, como a Segurança Pública e Saúde.
No Rio de Janeiro, por exemplo, a população vem sofrendo há anos com a falta de pessoal nos hospitais federais.
Atualmente, um dos hospitais sob responsabilidade do Governo Federal que mais sofre com a falta de servidores é o de Bonsucesso, na Zona Norte da cidade.
A unidade conta com o frequente fechamento da emergência e perda de oncologistas para o setor privado. Ambas as áreas (Emergência e Oncologia) são as mais carentes para o hospital.
Além da Saúde, dentre os órgãos federais mais afetados pela falta de pessoal, três ganham destaque: Receita Federal, INSS e Ibama. Apesar de atuarem em áreas diferentes, o quadro defasado e, com isso, as dificuldades na prestação de seus serviços são comuns a todos eles.
Entenda a realidade de cada um desses órgãos e o porquê da necessidade de cada concurso, além dos problemas que o déficit de funcionários causa no funcionalismo.
Receita Federal
Sem concurso há seis anos, aReceita Federal do Brasil (RFB) tem um déficit de 21 mil funcionários e enfrenta outro grande problema: um corte de R$1 bilhão no orçamento de 2020.
A falta de recursos irá comprometer atividades realizadas nas 117 Delegacias, 30 Alfândegas, 42 Inspetorias, 327 Agências e 25 Postos de Atendimento.
Algumas unidades, inclusive, poderão ser fechadas durante o ano prejudicando ainda mais o atendimento aos contribuintes. Para este ano, o orçamento previsto da Receita é de R$1,8 bilhão, R$1 bilhão inferior ao executado em 2019 que foi de R$ 2,8 bilhões.
Para amenizar o déficit, o secretário especial da RFB, José Barroso Tostes, destinou vagas à reversão de inativos para o ano de 2020. Desta forma, 50 auditores-fiscais e 50 analistas-tributários aposentados voltarão ao serviço ainda este ano.
Mesmo com a medida, sem um novo concurso Receita, o órgão segue com dificuldades para conseguir realizar suas atividades, como exercer a administração tributária e aduaneira, fiscalizar e coibir a sonegação fiscal, a lavagem de dinheiro, o contrabando, o descaminho, entre outros crimes. O processo afeta diretamente as funções do estado e a população.
Atualmente, para realizar este trabalho, o Ministério da Economia conta com 16.908 servidores das carreiras de Auditoria Fiscal da Receita Federal e do Trabalho, conforme dados referentes a novembro de 2019.
A falta de servidores na Receita afeta setores como: aeroportos - tanto na liberação de passageiros, como na liberação de exportações; segurança - no controle e apreensão de drogas; e políticas públicas - sem sistema da RFB, prefeituras serão impedidas de realizar licitação e até receber repasse de verbas.
Figurando os noticiários, a falta de pessoal no INSS não é nenhuma novidade. O Instituto Nacional de Seguridade Social teve seu último concurso para técnicos e analistas realizado em 2015 e ofertou 950 vagas - número inexpressivo diante do déficit já existente na época.
Apesar de não se ter um número exato de cargos vagos, estima-se que já passe de 20 mil. Somente para a carreira do Seguro Social seria preciso a contratação de 19 mil servidores, segundo a Fenasps (Federação Nacional de sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social).
Para que seja realizado um novo concurso INSS, a fim de sanar o problema da falta de pessoal, a autarquia precisa de uma autorização do Governo Federal, por meio do Ministério da Economia. Porém, o pedido para provimento de 7 mil vagas feito em 2018 ainda não foi deferido.
O Ministério da Economia alega que um dos motivos para a não realização do concurso é a falta de orçamento. No entanto, o Ministério Público Federal (MPF) alerta que o déficit de pessoal pode acarretar grandes prejuízos financeiros, principalmente por ações movidas contra a autarquia, que não consegue dar conta no prazo determinado da fila de processos e pedidos.
Diversas representações feitas ao MPF relatam a impossibilidade dos cidadãos em exercer o direito constitucional à Seguridade Social. Isso por conta da exagerada demora na análise dos requerimentos de concessão de benefícios previdenciários e assistenciais.
O número de pedidos aguardando análise do INSS já chega perto de 2 milhões. Como forma de acabar com essa grande fila, o governo emitiu um decreto que regulamenta a contratação de militares inativos para atividades de natureza civil no funcionalismo público.
Em ação civil pública, movida pelo MPF, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) determinou parcialmente - ao agravo de instrumento do MPF - que o INSS disponibilize em 90 dias (até maio) "pessoal capacitado" nas agências da Previdência.
A convocação de aposentados pode ser uma solução diante da decisão do TRF2. No entanto, a melhor forma na visão de especialistas, é contratar 'pessoal capacitado' via concurso público, já que o problema do INSS não é pontual, mas de anos sem concursos periódicos.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é outro que sofre com um grave déficit de servidores. Em 2019, houve uma queda de 24% no número de fiscais em relação a 2018. O órgão, fundamental para a preservação do meio ambiente, já chega a marca de seis anos sem concurso público,
Segundo dados do Ibama, de janeiro a agosto de 2019 a quantidade de autuações ambientais em todo o país teve uma redução de 28,59%. Alguns agentes do Instituto manifestaram preocupação com um possível colapso da gestão ambiental federal.
A grande questão é que problemas como esse podem estimular o aumento de crimes ambientais dentro e fora da Amazônia. De queimadas a óleo no Nordeste, no ano de 2019 o Brasil presenciou alguns desastres no meio ambiente.
No segundo semestre de 2019, o Ministério Público Federal (MPF) enviou ao governo uma recomendação para que se realizasse o concurso Ibama, no entanto, a seleção não recebeu o aval do Ministério da Economia.
A Assessoria de Imprensa da Economia informou à FOLHA DIRIGIDA que o documento encaminhado ao MPF relata limitações fiscais e orçamentárias. Porém a íntegra do texto não foi divulgada por nenhum dos órgãos envolvidos.
O número de funcionários do Ibama cai e, em contrapartida, os problemas ambientais crescem. A Controladoria-Geral da União, em janeiro de 2017, constatou que, no período de 2012 a 2015, houve aumento de 75% na taxa de desmatamento. Enquanto isso, houve o encolhimento de 15% no quadro de fiscais ambientais.
E mesmo com o grande déficit de servidores, a situação ainda pode piorar. Dados de 2016 apontam que, na época, cerca de 38% dos agentes ambientais federais possuíam 30 anos ou mais de tempo de serviço. Além disso, 19% já estavam usufruindo de abono de permanência.
Após a reforma da previdência, é esperado que nos próximos anos muitos servidores se aposentem. Ainda vale ressaltar que, em 2016, 58% dos fiscais já possuíam idade igual ou superior a 50 anos, o que dificulta a realização de ações de campo, por exigirem maior condicionamento físico.
Assim como aconteceu com o INSS, existe uma expectativa de que o caso seja judicializado. Se isso acontecer, a Justiça poderá determinar a abertura de concurso Ibama para cargos efetivos.
Apesar de terem concursos recentes, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal também apresentam quadros de servidores incompletos. Na PF, o déficit de profissionais gira em torno de 4 mil, segundo informado pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, em fevereiro de 2019.
Já na PRF, faltam mais de 3 mil servidores. Isso porque a corporação tem previsto em lei uma quadro de 13 mil policiais, mas atua com cerca de 10 mil. A boa notícia nestes dois casos é que ambas têm concursos previstos.
Para o concurso Polícia Federal, o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Edvandir Paiva, deu uma declaração, em janeiro, indicando que o pedido enviado pela corporação contempla 3 mil vagas para uma nova seleção.
No caso da PRF, foram solicitadas 4.435 vagas ao Ministério da Economia. Destas, 4.360 são para policial rodoviário federal (nível superior em qualquer área, idade entre 18 e 65 anos e carteira de habilitação), e 75 para agente administrativo (nível médio).
Como o Governo Federal já manifestou por diversas vezes que pretende reforçar a área de Segurança, as expectativas para que essas seleções acontecem em breve são otimistas.