Brasil é um dos países com melhores salários para servidores federais

Estudo do Banco Mundial aponta que servidores federais ganham 96% a mais que funcionários do setor privado em funções semelhantes.

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Publicado em:14/10/2019 às 07:55
Atualizado em:14/10/2019 às 07:55

Ascenção na carreira, estabilidade empregatícia, entre outros fatores são os motivos pelos quais os brasileiros buscam uma oportunidade na carreira pública. Mas, um dos principais atrativos são as remunerações oferecidas em órgãos públicos em todo o Brasil.

De acordo com um estudo publicado pelo Banco Mundial no último dia 9, o Brasil é um dos países que mais investem nos seus servidores. Em 2018, 10% do Produto Interno Bruto (PIB) foi destinado ao pagamento de salários e vencimento de servidores públicos.

O país também é um dos que mais contratam via concurso. “A relação entre o número de funcionários públicos e a população no Brasil (5,6%) é mais alta que a média latino-americana (4,4%), mas inferior a países da OCDE (9,5%)”, relatou o estudo.

Além disso, o documento aponta que a diferença média dos salários dos servidores federais para profissionais do setor privado com funções semelhantes chega a 96%. Os motivos para essa diferença são inúmeros.

Entre os principais estão: as altas taxas de juros praticadas no Brasil, o sistema tributário e a capacidade de organização dos servidores públicos. Quem explicou essa relação foi auditor do Tribunal de Contas do DF, professor de Discursivas e Peças Técnicas e consultor de preparação para concursos, Leonardo Murga.

Estudo chamou atenção por apontar valores de salários para servidores federais
muito superior aos dos profissionais do setor privado (Foto: Pixabay)

Entenda os motivos das diferenças salariais nos setores públicos e privados

“A taxa básica de juros, embora em queda, ainda é uma das mais altas do mundo. Ademais, o spread bancário brasileiro (diferença entre a taxa de juros cobrada pelos bancos dos tomadores de crédito e a paga aos depositantes) é gigantesco. Tais fatores deprimem dois motores econômicos, quais sejam: a capacidade privada de investimento e o consumo das famílias”, explicou.

Diante desse cenário, os empresários encontram dificuldades para captação de empréstimos com taxas de juros razoáveis, distanciando-se de um processo produtivo mais alinhado às boas práticas internacionais.

“Sem capacidade para investir, novos negócios não surgem, o ganho produtivo de escala some e, consequentemente, o emprego não aparece ou resta subvalorizado”, concluiu Murga.

A falta do emprego bem remunerado acarreta na perda de volume de vendas, que, por sua vez, faz com que os produtos/serviços passem a custar mais caro. Em meio a todo esse processo, o consumidor se vê obrigado a financiar compras e conviver com as taxas.

Em relação ao sistema tributário, Murga explicou que “o Estado, ao taxar prioritariamente o consumo em detrimento da renda, gera ainda mais pressão negativa sobre mercado, pois, além de arrecadar menos do que poderia, esmaga os dois citados motores econômicos.” 

Segundo o especialista, tendo em vista esse cenário, se torna muito mais atraente para quem tem recurso em caixa, investi-los em produtos financeiros, como títulos da dívida pública, do que investir no nosso processo produtivo. 

Para Murga, o estudo do Banco Mundial revela que o empregado privado no Brasil ganha menos do que deveria. Pensamento que lança outra perspectiva aos dados apresentados, cuja avaliação inicial pode levar a ideia de que os salários dos servidores públicos estejam altos demais.

“Tal situação pode ser comprovada pelo valor do salário mínimo necessário para sustentar uma família de quatro pessoas, estimado mensalmente pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos, ser de R$ 3.980,82 (setembro/2019), em oposição ao valor do salário mínimo real, disposto em decreto presidencial, de R$ 998,00.”

Já a explicação para o terceiro motivo citado é bem simples. “Os servidores públicos, até pela proximidade com os entes estatais, possuem capacidades de organização e reivindicação bastante superiores à dos empregados privados.”

Serviços de servidores públicos e profissionais da rede privada não podem ser facilmente comparados

A própria pesquisa do Banco Mundial justifica o fato ao afirmar que, em geral, servidores públicos em todo o mundo ganham, em média, melhor que funcionários da rede privada em condições semelhantes.

“É importante salientar que o serviço público é infinitamente mais complexo do que a pesquisa recente quer fazer parecer. Há inúmeros vínculos empregatícios, tais como: agentes políticos eleitos; indicações políticas para diversos cargos, inclusive vitalícios; servidores temporários; funcionários terceirizados; e, por fim, alguns poucos agentes políticos e servidores efetivos, ambos do corpo permanente estatal e, portanto, concursados” ressaltou Leonardo Murga.

Ou seja, o especialista lembra que há cargos que, simplesmente, não possuem similares na iniciativa privada. Esse é o caso dos policiais federais, por exemplo. Ainda que existam profissões similares nos dois setores (público e privado), as atribuições dos profissionais não podem ser facilmente comparadas.

“Será que um gestor público (ordenador de despesas), responsável por bilhões de reais e que responderá, não como agente público, mas como pessoa física por algum eventual problema, que deve prestar contas aos sistemas de controle interno e aos Tribunais de Contas, bem como age sob vigilância constante do Ministério Público, pode ser equiparado a um empresário?”, questionou.

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Número de servidores públicos pode voltar a crescer no Brasil

Segundo o estudo, a partir de 2014, quando houve queda da arrecadação tributária, também houve queda nos reajustes salariais e redução do número de servidores públicos. Apesar do que diz a pesquisa sobre o excesso de funcionários públicos no país, Murga apresenta outros dados.

“No Brasil, há muito menos servidores públicos do que o necessário. Proporcionalmente, há menos pessoas servindo a população aqui do que há em praticamente todos os países desenvolvidos. Temos, por exemplo, algo em torno de 12 mil policiais federais para cuidar de 12 mil quilômetros de fronteira.”

Desse modo, a expectativa é que o número de servidores volte a crescer, considerando que a população aumenta constantemente e que devem ser garantidos a ela serviços básicos, como educação, saúde e segurança. 

“Entretanto, há de se questionar o tipo de vínculo empregatício que as pessoas que virão a trabalhar futuramente para o Estado terão. Gosto de acreditar que a opção pelo mérito – concurso público – irá prevalecer”, alertou o especialista.

Outro dado apontado pelo estudo é que cerca de 20% a 26% dos servidores efetivos deverão se aposentar até 2022. Tal informação gera uma expectativa sobre a autorização de novos concursos federais, para reposição desses postos de trabalho. 

Segundo Murga, certamente os quadros precisarão ser repostos sob pena de total paralisia na prestação dos serviços públicos. Além disso, o governo precisa manter a eficiência dos serviços prestados à população.

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Os valores das remunerações de servidores federais no Brasil são justificáveis?

A pesquisa do Banco Mundial propõe estratégias como revisão salarial e aumento do intervalo entre as progressões, além da diminuição do reajuste entre elas para que o governo diminua os gastos com pessoal. Leonardo Murga alertou que é preciso cautela para abordar o problema.

Segundo ele, as medidas propostas na reforma administrativa podem ser implementadas, embora não sejam capazes de diminuir as despesas públicas em valores consideráveis. Isso porque o maior gasto público, não é com a previdência ou com o corpo de pessoal, mas sim com o serviço da dívida, como afirmou o auditor do TC-DF. 

“Embora o principal da dívida não seja tão alto, o custo da dívida é totalmente descompassado com os padrões mundiais”, explicou.

Após toda essa análise, Leonardo Murga respondeu um dos pontos centrais de todo o levantamento feito pelo Banco Mundial: os valores das remunerações pagas a servidores federais no Brasil são justificáveis?

“Como já mencionado, há distorções. Entretanto, é importante salientar que a maioria delas já consta como resolvida. No início dos anos 2000, os institutos da paridade e da integralidade remuneratórias foram abolidos. Em 2012, a previdência dos servidores públicos federais foi equiparada à previdência privada, ou seja, ao teto do INSS”, disse.

E complementou: “ademais, não há mais a possibilidade de incorporação de funções e não há recomposições salariais programadas, como a revisão geral anual do art. 37, X, da Constituição Federal”.

Por fim, Murga disse não acreditar que a diminuição desses salários poderia interferir na motivação dos que almejam uma vaga na carreira pública. “As carreiras ainda são muito boas e a possibilidade de servir o próprio país ainda é algo muito atrativo para muitos jovens”, afirmou.