Concursos Militares: por que a presença da mulher ainda é um tabu?
No dia Internacional da Mulher, 8 de março, Folha Dirigida traz um tabu ainda no mundo dos concursos militares: as vagas para elas. Confira!
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Publicado em:08/03/2021 às 07:00
Atualizado em:08/03/2021 às 07:00
Em 8 de março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. E nessa data, que é um marco nas conquistas sociais, políticas e econômicas ao longo dos anos, mas também motivo de reflexão, Folha Dirigida traz um tabu ainda no mundo dos concursos militares: as vagas para elas.
Infelizmente, a luta por vagas na área Militar não se restringe às Forças Armadas. Por diversas vezes, os concursos militares estaduais também são alvo de decisões judiciais, por conta da restrição no seu quantitativo de vagas para o público feminino.
Na época, foram convocados duas vezes mais homens do que mulheres, o que excluiria a candidata das avaliações seguintes.
Quatro anos depois, em 2018, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) recomendou ao Comando-Geral da PM DF, que retificasse o seu edital para soldados. A mudança deveria ocorrer no quantitativo de vagas entre homens e mulheres.
Segundo o MP, a restrição de apenas 50 vagas para mulheres, do total de 500 para o cargo de soldado, era ilegal. No entendimento dos promotores de Justiça:
"O edital violou os princípios da legalidade, razoabilidade e igualdade e criou obstáculos ao direito ao livre acesso a cargo público".
No mesmo ano, mais dois concursos tiveram o mesmo problema. As seleções para soldado e oficial da PM e do Corpo de Bombeiros do Mato Grosso do Sul foram retificadas, após recomendação do MP, por meio de uma Ação Civil Pública (ACP).
A decisão foi pela igualdade do número de vagas entre homens e mulheres. Segundo a ACP, com a limitação de vagas, haveria uma interferência na convocação para as demais fases dos concursos.
Na seleção de oficiais da PM MS, por exemplo, seriam 24 candidatas convocadas contra 93 do sexo masculino.
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Reserva de vagas x limite de vagas
A reserva de vagas para mulheres em concursos da área da Segurança não é ilegal. Isso porque essa cota permite uma reparação histórica, para que elas garantam um espaço destinado por muitos anos aos homens.
No Rio de Janeiro, por exemplo, a PMERJ recebeu a sua primeira turma feminina há apenas 39 anos, no dia 17 de março de 1982. Na época, 158 mulheres ingressaram como soldado no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP).
Conforme dados da Pesquisa Perfil das Instituições de Segurança Pública (Senasp) de 2019, as mulheres ocupam 46.220 cargos e os homens 357.887 postos, nas Polícias Militares. Já no Corpo de Bombeiros, são 8.069 mulheres na ativa contra 58.603 homens.
Por conta disso, as cotas para as mulheres se tornam necessárias nos concursos militares estaduais. No entanto, não se pode confundir número mínimo de vagas, com limite de vagas.
Ou seja, a reserva de vagas pode existir e, neste caso, deve ocorrer. Mas a limitação de vagas às mulheres não deve ser feita, como teria ocorrido no concurso da PM DF, antes da retificação.
Projetos de Lei buscam cotas maiores para mulheres
E para garantir cada vez mais a participação feminina nos concursos da área da Segurança, pelo menos dois Projetos de Lei estão em curso. No PL 140/19, apresentado pela deputada Renata Abreu (Pode-SP), o objetivo é reservar 25% das vagas para elas.
O PL apresentado pela parlamentar tem igual teor ao PL 6299/16 (arquivado), de autoria do ex-deputado Cabo Sabino (PR-CE).
Em sua justificativa, a deputada reafirma o texto do ex-deputado, que traz dados da Pesquisa Perfil das Instituições de Segurança Pública (Senasp) de 2011, em que a participação feminina nas Policiais Civis correspondia a menos de 20% do efetivo nacional.
"Nas Polícias Militares e Bombeiros, essa participação é de 7,2% e 7,9%, respectivamente. Nessas duas corporações militares, vários estados ainda mantêm as cotas para o ingresso de mulheres, variando de 10% a 15% das vagas disponibilizadas a cada concurso", diz trecho do texto.
O mesmo ocorre no Projeto de Lei 5361/19, que também busca uma reserva de 25% das vagas para as mulheres, nos concursos públicos da Segurança.
Nesse caso, no entanto, a reserva será aplicada sempre que o número de vagas oferecido for igual ou superior a quatro. A proposta, do deputado Roberto Pessoa (PSDB-CE), tramita na Câmara dos Deputados.
Pelo texto, as candidatas concorrerão ao mesmo tempo às vagas reservadas e às destinadas à concorrência geral, de acordo com a sua classificação no concurso.
Segundo Roberto Pessoa, a proposta tem o objetivo de subsidiar a formulação de projetos e políticas pautadas pelo respeito à igualdade de gênero.
Ainda segundo o deputado, a entrada das mulheres nas instituições de segurança pública, particularmente nas forças policiais, vem se dando de forma gradativa desde o século passado e tem como objetivo melhorar a relação das instituições com a sociedade.
"Afastar a imagem de truculência, corrupção e abusos que acompanham a história dessas instituições constituiria o efeito esperado dessa presença feminina nos quadros policiais, ou seja, a atuação policial deixaria de ser uma atuação eminentemente de força e de intimidação para, aos poucos, tornar-se uma atuação relacional com a sociedade, técnica e protetiva", defende.
E as Forças Armadas também mantêm esse tabu?
A presença de mulheres em concursos militares ainda é um tabu. Mas, aos poucos isso tem sido jogado sobre terra. Nas três Forças Armadas não é diferente.
Porém, Exército e Aeronáutica já aceitam mulheres em praticamente todos os seus concursos de admissão aos cursos de formação. Já a Marinha, ainda tem restrições em alguns de seus editais.
Um deles, inclusive, está prestes a quebrar esse tabu e pode surpreender a todos com a oferta de vagas para mulheres este ano: o de aprendiz de marinheiro.
Confira a seguir a lista dos concursos de Forças Armadas que já aceitam mulheres:
Exército
Escola de Formação Complementar do Exército EsFCEx
Escola Preparatória de Cadetes do Exército - EsPCEX
Escola de Sargentos das Armas - ESA
Escola de Saúde do Exército – EsSEx
Instituto Militar de Engenharia IME
Quadro de Capelães Militares -
Aeronáutica
Escola Preparatória de Cadetes-do-Ar - EPCAR
Academia da Força Aérea - AFA
Escola de Especialistas de Aeronáutica - EEAR
Estágio de Adaptação à Graduação de Sargento da Aeronáutica (EAGS)
Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica (CIAAR): médicos, dentistas e farmacêuticos.
Estágio de Adaptação de Oficiais de Apoio de Aeronáutica - EAOAP;
Estágio de Adaptação de Oficiais Engenheiros da Aeronáutica - EAOEAR
Marinha
Escola Naval - para o Corpo de Intendentes de Marinha (CIM)
Sargento Músico Fuzileiro Naval
Corpo Auxiliar de Praças da Marinha (CAP)
Corpo de Saúde da Marinha (CSM): médicos, dentistas, apoio à saúde: enfermagem, farmácia, fisioterapia, fonoaudiologia, nutrição e psicologia.
Corpo de Engenheiros da Marinha (CEM)
Quadro Técnico (QT)
Quadro Complementar de Intendentes (QC-IM).
Quadro de Capelães Navais
Os requisitos para ingresso são diversos, dependendo da Força Armada e da respectiva escola. Podem concorrer mulheres com níveis fundamental, médio, técnico e/ou superior, em diversas escalas de patentes.
Além disso, tem ainda as exigências por idades, que são variáveis. A maioria dos concursos militares das Forças Armadas são compostos por diversas etapas de seleção, começando por provas objetivas e chegando ao curso de formação, por último.
As mulheres, sem exceção, passam por todas as etapas. O que diferencia, em muitos casos, é a dificuldade e o nível de cobrança do teste de aptidão física (TAF), que pode ser adaptado, de acordo com a especialidade e formação.
Concursos que ainda não têm vagas para mulheres
Embora a lista acima já seja bem grande, alguns concursos ainda lidam com um tabu e ofertam vagas apenas para candidatos do sexo masculino.
Nessa lista, a supremacia é toda da Marinha do Brasil, que está prestes a diminuí-la com a grande expectativa de oferta de vagas para mulheres, em 2021, no concurso de aprendiz de marinheiro.
Veja a lista de concursos que ainda não contemplam mulheres
Escolas de Aprendizes-Marinheiros (EAM)
Colégio Naval (CPACN)
Comando de Fuzileiro Navais (CFN)
Quadro Técnico de Praças da Armada (QTPA)
Colégio Naval x Escola Naval
Você sabe qual é a diferença do Colégio Naval para a Escola Naval? A principal e que todos já sabem é que um concurso tem formação de nível médio e outra de nível superior.
Mas, outra diferença é a oferta de vagas para mulheres. Por que um tem e o outro não?
Para te explicar melhor. Para ingressar no Colégio Naval, o candidato deve ter o nível fundamental completo e, dentro da Marinha, vai realizar a formação de nível médio.
Já na Escola Naval, o concurso pede nível médio completo. Isso porque, lá dentro, ele será graduado, saindo com formação de nível superior. Para quem não sabe, inclusive, ao final do curso, os aprovados no colégio são instruídos para a Escola Naval e não precisam de admissão em um novo concurso.
Mas, enquanto a Escola Naval admite em seu concurso candidatos de ambos os sexos, o Colégio Naval aceita apenas mulheres.
Essa é uma regra que a Marinha não explica, mas por anos foi um tabu a ser quebrado. No site da instituição, a única explicação que consta é a seguinte:
“Este concurso, até o momento, só aceita candidatos do sexo masculino que tenham 15 e menos de 18 anos no dia 1° de janeiro do ano da matrícula do curso de formação.”
E, para explicar a diferença entre o colégio e a escola, a Marinha diz:
“A diferença básica entre os dois é que o Colégio Naval é para candidatos com o ensino fundamental completo e nele farão o ensino médio. Já a Escola Naval é para quem tem o ensino médio completo, lá os alunos fazem o nível superior.”
Próximo concurso Colégio Naval pode vir com vagas para mulheres. Entenda!
Esse tabu está prestes a ser quebrado. Isso porque, em 2020, a Justiça Federal do Distrito Federal, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), determinou que o Colégio Naval permita a inscrição de mulheres em seus próximos concursos.
Além disso, o órgão federal ainda exige que possam ser inscritos homens casados ou em união estável - o que também era uma exceção. Caso a decisão não seja cumprida, o Colégio Naval poderá ser punido.
Vale lembrar que essa ação foi movida em setembro de 2019, no Distrito Federal. Ela foi publicada pela 9ª Vara Federal Cível do DF, acatando a solicitação e o pedido de tutela de urgência.
Veja um trecho da sentença:
“O perigo da demora resta demonstrado, pois o ingresso de candidatas mulheres e de candidatos casados/união estável no CPACN em 2019 já foi impedido, o que ceivou o direito de dezenas de candidatos. Diante do exposto, acolho os embargos declaratórios opostos pelo MPF, para reconhecer a ocorrência de erro material na decisão de fls. 270/271, declarando-a sem efeitos. Defiro a tutela de urgência, para determinar que a União se abstenha de impedir a inscrição para o Colégio Naval, da Marinha do Brasil, de candidatas do sexo feminino e de candidatos casados ou em união estável, nos próximos concursos para admissão a serem realizados, sob pena de cominação de multa diária por descumprimento”, - disse o juiz Renato Borelli.
Escola de Aprendiz de Marinheiro: vagas para mulheres estão confirmadas?
Outro concurso que luta por quebrar a hegemonia masculina é o da Escola de Aprendiz de Marinheiro (EAM), que ainda não oferta vagas para mulheres. Pode-se dizer, inclusive, que este é um dos mais esperados pelo público feminino para ter a oferta.
Em 2020, a Marinha criou uma expectativa muito grande ao cogitar que passaria a ofertar vagas para mulheres a partir de 2021. Isso foi citado em uma matéria da própria instituição e noticiado por Folha Dirigida.
A reportagem apurou que essa previsão permanece, mas ainda não está confirmada. A Marinha também não tem ainda um quantitativo fechado. Mas, se confirmado, deverá ser em torno de 5% a 10% do quantitativo total.
Geralmente, a EAM oferece de 900 a 1.100 vagas para aprendizes. Com isso, é possível que sejam destinadas até mais de 90 vagas para o público feminino.
Atualmente, o requisito para ingresso na EAM é o seguinte:
Ser brasileiro nato ou naturalizado;
Ter 18 anos completos e menos de 22 no dia 1º de janeiro do ano do curso;
Ter concluído o ensino médio ou estar em fase de conclusão;
Exclusivo para sexo masculino;
Ter idoneidade moral e bons antecedentes de conduta;
Estar em dia com as obrigações civis e militares.
Mulheres atuam pela 1° vez na linha de combate, mas ainda com restrições
Isso significa que elas passariam a fazer parte da atuação operacional da Marinha do Brasil, que, nada mais é que, basicamente, servir a bordo de navios, conhecendo outros portos e países, e ir a combate junto com o pelotão em operações em terra.
Isso foi possível graças à oferta de vagas no concurso da Escola Naval. Com isso, as mulheres puderam ingressar no Corpo da Armada (CA) e no Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) da Escola Naval (EN).
Elas agora também podem fazer parte do Corpo de Intendentes da Marinha (CIM), opção já aceita antes.
Mas, se por um lado as mulheres já podem fazer parte e ingressar no corpo da armada e de fuzileiros navais promovidos também pela Escola Naval, os concursos de admissão ainda permanecem sendo apenas para homens.
► O que faz o Corpo da Armada (CA)?
Segundo a Marinha, o curso de graduação e habilitações que o Corpo da Armada oferece ao aluno é: mecânica, eletrônica e sistemas de armas. Oficiais do CA são aqueles que cumprem as tarefas de defesa da pátria, embarcados em Navios, fazendo o desembarque de tropas de fuzileiros navais, guerra antiaérea, superfície e submarina; fazem a operação e a navegação em todo o Brasil e ainda conhecem outros lugares e países.
► O que fazem os fuzileiros Navais (CFN)?
A instituição também explica que os fuzileiros Navais são militares que fazem parte de tropa embarcada em navios que são projetados para terra para operações anfíbias.
Entre as suas finalidades, está a atuação em terra, porém eles podem atuar também na água. O aspirante que opta por esse Corpo tem a opção de se habilitar em Mecânica, Eletrônica e Sistemas de Armas.
Mulheres na Marinha também podem ingressar pelo Serviço Voluntário
Além das admissões por meio de curso de formação, as mulheres também podem ingressar na Marinha do Brasil por meio dos processos seletivos do Serviço Militar Voluntário, veja:
-> Níveis fundamental com Curso de Formação Inicial Continuada (C-FIC) e médio/técnico
Corpo de Praças da Reserva da Marinha (CPRM)
-> Nível superior
Corpo de Oficiais da Reserva da Marinha (CORM) dos quadros referentes às profissões, tais como Quadro de Engenheiros, de Médicos e Veterinários, Dentistas, Apoio à Saúde, Quadro Técnico (QT) e Técnico-Magistério.
Curiosidades sobre a mulher na Marinha do Brasil
⇒ A Marinha foi a primeira Força Armada a abrir as portas para as mulheres. Isso ocorreu em 1980.
⇒ A Marinha foi a primeira Força Armada a ter uma oficial general (almirante). Isso ocorreu em 2012.
⇒ A primeira almirante da Marinha, posto mais elevado, já está na reserva.
⇒ A Força Naval admitiu, em 2014, a primeira turma de aspirantes femininas da Escola Naval.
Segundo a Marinha do Brasil, atualmente as mulheres estão em quase todos os postos e graduações da Força Naval. A instituição ainda destaca que, devido ao mérito e à competência demonstradas ao longo dos anos, as mulheres conquistaram cargos e funções importantes:
Diretora de Organizações Militares;
Chefe do Destacamento do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade;
Subchefe da Estação Antártica Comandante Ferraz;
Integrantes da Força-Tarefa Marítima na Força Interina das Nações Unidas no Líbano (FTM-UNIFIL);
Integrantes da missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH) e da Missão de Paz das Nações Unidas na República Centro-Africana (MINUSCA), que resultou no prêmio, por dois anos consecutivos;
Defensora Militar da Igualdade de Gênero da Organização das Nações Unidas (ONU), pelo trabalho realizado como assessora militar de gênero.
Além, também, de comporem a tripulação dos meios de esquadras. A presença das mulheres na Marinha e em todas as Forças Armadas têm se polarizado e deve, sim, ser cada vez mais valorizada.
“Que o legado formado ao longo destes anos sirva de inspiração às novas gerações e de estímulo para futuras conquistas, consolidando cada vez mais a compreensão de que, por mérito próprio, elas são parcela relevante e indispensável da nossa Força”, diz a corporação como mensagem a todo o público.