Coronavírus: quais impactos estão sujeitos o trabalhador com a MP 927?

Entenda os principais pontos da MP que traz uma série de alterações trabalhistas

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Publicado em:23/03/2020 às 15:40
Atualizado em:23/03/2020 às 15:40

No último domingo, dia 22, foi publicada a Medida Provisória 927, que apresenta alternativas trabalhistas para redução do desemprego durante a pandemia do Coronavírus no Brasil. O intuito é traçar estratégias para o enfrentamento do estado de calamidade pública, decretado após a propagação da Covid-19 no país.

O advogado trabalhista Fabiano Zavanella — sócio do Rocha, Calderon e Advogados Associados — esclareceu os impactos dos principais pontos da MP no mercado de trabalho. Confira:

Medidas sugerem de teletrabalho a férias coletivas
(Foto: Agência Brasil/Reprodução)

Teletrabalho

O que diz a MP: o empregador poderá alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho (home office), independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, sendo dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho. 

Zavanella explica que o teletrabalho corresponde ao chamado trabalho remoto e ao trabalho à distância. O que a medida propõe é que sejam maiores formalidades para a transformação da prestação de serviço no modelo presencial para uma dessas modalidades, sem controle de jornada. 

“O ajuste em relação a equipamentos, despesas, etc. será feito individualmente e, caso o empregado não tenha condições de arcar, o empregador poderá custear, mas sem ter natureza salarial”, completou.

Antecipação das férias individuais

O que diz a MP: durante o estado de calamidade o empregador, informará ao empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, 48 horas. 

No entanto, as férias não poderão ser de períodos inferiores a cinco dias; e poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido.

De acordo com Zavanella, também está prevista a antecipação de férias futuras. Ou seja, além dessa próxima, outras necessárias para cobrir esse período poderão acontecer.

Concessão de férias coletivas

O que diz a MP: o empregador poderá conceder férias coletivas, desde que, notifique seus empregados com antecedência mínima de 48 horas.
 
O advogado trabalhista explicou que não há obrigatoriedade de comunicar previamente ao Poder Executivo, nem aos sindicatos, caso o empregador opte por essa estratégia.

Banco de horas

O que diz a lei: ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição do regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas. A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias.

Zavanella destacou que o banco poderá ser de até 18 meses, ajustável individualmente ou coletivamente. Esse prazo começa a contar do fim do decreto de calamidade pública.

Diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)

O que diz a lei: fica suspensa a exigência do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente aos meses de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente. Os empregadores poderão adotar essa medida independentemente do número de empregados; do regime de tributação; da natureza jurídica; do ramo de atividade econômica; e da adesão prévia. 

Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho

O que diz a lei: fica suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais.

Aproveitamento e antecipação de feriados

O que diz a lei: empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, desde que notifiquem os empregados beneficiados com antecedência de, no mínimo, 48 horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. 

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Confira outros pontos destacados pelo advogado

O advogado ainda destacou outros pontos, como o acordo individual, que consiste no reconhecimento da garantia do vínculo de emprego entre empregado e empregador, predominando sobre os demais instrumentos coletivos existentes e a própria lei, até o limite da Constituição Federal. Poderá ser estendido, inclusive, para a suspensão do contrato de trabalho no período de calamidade pública.

Quanto ao artigo que aborda o décimo terceiro salário, Zavanella explicou que este pagamento só poderá ser feito até o limite do pagamento do 13º salário. Já o valor referente às férias, deverá ser quitado no 5º dia útil do mês subsequente, não mais de forma antecipada como de costume.   

Também está prevista na medida provisória a suspensão dos prazos para defesa ou recursos administrativos de eventuais autuações ou discussões nessa esfera. 

Medida Provisória divide opiniões no Congresso

Um dos artigos da Medida Provisória 927 foi duramente criticado no Congresso, conforme divulgado pela Agência Senado. Trata-se do art. 18, que permitia a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses sem salário, durante a vigência do estado de calamidade pública.

Alguns senadores usaram seus perfis nas redes sociais para criticar a medida. O Senador Rogério Carvalho, líder do PT, disse que a MP é uma “crueldade contra o trabalhador”.

 “Não se salva a economia sem pensar nos seres humanos. A MP de Bolsonaro, editada na calada da noite deste domingo, é revoltante, cruel, desumana. Não fala como os brasileiros vão pagar o aluguel, a conta de água, luz, cesta básica. Agrava ainda mais a situação dos trabalhadores”, escreveu.

Randolfe Rodrigues também se manifestou contra a medida, dizendo que este “é um dos maiores ataques ai povo mais pobre que já ocorreu”.  E completou:

“No mundo inteiro, o Estado está se responsabilizando pelo pagamento dos trabalhadores para que passem pela crise do coronavírus. Aqui, Bolsonaro apresentou a MP 927 que permite reduzir salários e benefícios trabalhistas. É um criminoso! Uma covardia sem precedentes! O trabalhador está sendo massacrado! Vamos lutar contra!”

Já a senadora Kátia Abreu declarou que vai apresentar emendas. A senadora afirmou que a MP cuida das empresas e questionou: “quem vai cuidar dos que ficarão quatro meses sem receber?”.

Em meio à pressão no Congresso, nessa tarde, o presidente Jair Bolsonaro anunciou em suas redes sociais que vai voltar atrás em relação ao artigo que permite a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sem salário.

Alguns senadores defendem medidas propostas pelo governo

Sem citar a MP, o senador Fernando Bezerra Coelho disse em uma rede social que o governo “está monitorando o mercado de trabalho para oferecer medidas que protejam os trabalhadores e suas famílias”.

“É preciso assegurar renda para os mais vulneráveis, preservar o emprego e manter a economia funcionando. Não é simples alcançar esse equilíbrio em um cenário fiscal restritivo. Mas não faltará coragem ao governo para agir em defesa dos trabalhadores”, publicou.

O senador Chico Rodrigues também defendeu as medidas anunciadas por Bolsonaro. “Sabemos que o mais difícil de compreender é o empresário não ter a obrigação de pagar os salários. Mas o microempresário tem uma dificuldade enorme. Como ele vai pagar aluguel? Como vai pagar fornecedores e outros encargos, se ele não está vendendo? Se está com as portas fechadas?”, questiona.

O parlamentar sugeriu que a Caixa Econômica Federal conceda empréstimos para que os empregadores possam manter os salários dos trabalhadores em dia.

 “Já sugerimos que a Caixa possa fazer o adiantamento de dois ou três meses de recursos para os pequenos e micro empresários poderem pagar os seus funcionários. Temos que ter outra saída também”, destacou.