Entenda a importância dos trabalhadores de serviços essenciais
Profissionais contam sua experiência de trabalho durante pandemia de Coronavírus
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Publicado em:02/05/2020 às 06:00
Atualizado em:02/05/2020 às 06:00
Há um mês e meio os brasileiros encaram uma nova dinâmica social. Escolas, universidades, escritórios, shoppings e diversos outros estabelecimentos fecharam as portas temporariamente com um único propósito: evitar as aglomerações e manter as pessoas em casa, seguras.
As medidas adotadas por diversos governadores no país visam à proteção das pessoas contra o novo coronavírus, doença respiratória que já infectou mais de 3,21 milhões de pessoas em todo o mundo. Até o fechamento desta matéria, foram registrados mais de 81 mil casos no Brasil.
Além de ficar em casa e evitar aglomerações, a recomendação do Ministério da Saúde é redobrar os cuidados com a higiene. Isso incluí:
Lavar as mãos, com frequência, até a altura dos punhos, com água e sabão, ou higienizá-las com álcool em gel 70%;
Ao tossir ou espirrar, cobrir nariz e boca com lenço ou com o braço, e não com as mãos;
Evitar tocar olhos, nariz e boca com as mãos não lavadas;
Ao tocar, lavar sempre as mãos, como já indicado;
Manter uma distância mínima de cerca de 2 metros de qualquer pessoa tossindo ou espirrando;
Evite abraços, beijos e apertos de mãos;
Higienizar com frequência o celular e os brinquedos das crianças;
Não compartilhar objetos de uso pessoal, como talheres, toalhas, pratos e copos;
Manter os ambientes limpos e bem ventilados;
Se estiver doente, evitar contato físico com outras pessoas, principalmente idosos e doentes crônicos, e ficar em casa até melhorar;
Dormir bem e ter uma alimentação saudável;
Utilizar máscaras caseiras ou artesanais feitas de tecido em situações de saída de sua residência.
Mesmo com isolamento social, algumas atividades continuam funcionando
(Foto: Pixabay)
No entanto, mesmo com as medidas restritivas, alguns setores não podem parar suas atividades. É o caso de hospitais, clínicas, delegacias, transporte, entregas, comércio de produtos essenciais — como alimentos e remédios —, dentre outros.
Diante disso, milhares de brasileiros ainda precisam sair às ruas para garantir o acesso do restante da população a esses serviços. FOLHA DIRIGIDA conversou com alguns desses profissionais que relataram como tem sido a experiência de manter as atividades de trabalho em meio à pandemia da Covid-19.
Profissionais da saúde lutam para salvar vidas
"Minha prioridade é entregar o paciente com vida",
Vanessa Gomes (Foto: Aquivo Pessoal)
Vanessa de Jesus Gomes é enfermeira e trabalha diretamente no combate ao Coronavírus. Para ela, manter as atividades durante esse momento tem sido difícil. "Trabalhamos com medo de nos contaminar, mas essa foi a profissão que escolhemos e amamos", disse.
A rotina no hospital, segundo ela, mudou muito. Isso por conta da entrada de novos protocolos todos os dias, o que requer atenção redobrada de todos os profissionais.
"A equipe tenta entrar no ritmo e já estamos até mais unidos, um zelando pelo cuidado do outro. É daqui que muitos tiram seu sustento, então não tem como abandonar, mesmo assim não abandonaríamos. A enfermagem é muito humana."
O contato com os familiares também ficou mais complicado. No caso de Vanessa, por exemplo, além do trabalho no hospital, a enfermeira cuida sozinha dos dois filhos. O marido, trabalha embarcado e não pode estar com a família nesse momento.
Para garantir a segurança das crianças, Vanessa adotou algumas medidas, como tomar banho e deixar roupas e todos equipamentos de trabalho do lado de fora da casa. Além disso, a enfermeira não usa o mesmo banheiro que as crianças.
Vanessa também toma o cuidado de, durante o horário de trabalho, usar todos os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). Ainda mais, porque ela trabalha nas ambulâncias que transportam os pacientes infectados.
A enfermeira contou que acompanhar esses pacientes dentro da ambulância é, justamente, um dos momentos mais críticos na rotina de trabalho. A atividade requer muita atenção para evitar que qualquer problema ocorra durante o transporte. Além disso, para Vanessa, não permitir o acompanhamento dos familiares dos pacientes é uma tarefa difícil.
A enfermeira deixou uma mensagem a todos que têm a possibilidade de ficar em casa durante o período de isolamento social:
"Se cuidem, não está fácil, não vai ser fácil. Não terminou ainda, inclusive, não estamos nem na metade. Amem uns aos outros e a melhor forma de fazer isso agora é mantendo o isolamento social."
"Não é recesso, tampouco férias. Não é tempo de confraternização",
Jônatas Valentim (Foto: Arquivo Pessoal)
Jônatas Valentim é enfermeiro e atua em uma clínica particular da rede privada, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Para ele, vários aspectos dificultam o trabalho durante essa quarentena. A começar pelo transporte.
Como mora longe do local de trabalho, Jônatas depende dos trasportes públicos para se locomover e com a redução dos meios de trasporte circulando, ficou mais complicado chegar à clínica. Ver a negligência de uma parcela da população com a doença também incomoda o enfermeiro.
"O meu lado profissional sofre com a baixa no quadro de funcionários e perda de colegas de profissão, a sobrecarga dos que ainda resistem trabalhando, a falta de equipamentos de proteção individual adequados para o momento em que estamos vivendo", descreveu.
Outra questão crítica é a dificuldade na assistência ao paciente doente. Isso porque a Covid-19 é uma doença com um quadro de evolução muito rápido. Além disso, por ser uma doença "nova" os métodos de tratamento do doente ainda são confusos para todos os profissionais.
A relação com os familiares, segundo Jônatas, está bem mais restrita e privativa. "Apesar de eu fazer parte, também, do chamado "grupo de risco" por causa de doenças respiratórias pré existentes, a minha preocupação maior é com meus pais e avós que por terem a idade mais avançada e mais dificuldade de lidar com a doença", disse.
Na rotina de trabalho, um dos momentos mais difíceis é lidar com a falta de mão de obra, pois muitos profissionais da área também estão adoecendo. "O fato de lidar com os familiares dos pacientes é muito difícil, porque eles têm que confiar 110% nos profissionais, pelo fato do paciente ter que ficar isolado, o único elo que une a família ao paciente é o profissional."
Para se manter todos os dias trabalhando, mesmo com os riscos de contaminação, o enfermeiro conta que a ajuda espiritual e a fé ajudam muito nesse momento. Além disso, o reconhecimento dos pacientes e familiares também é recompensador.
"A cada vez que vejo um paciente curado ou pelo menos confortável com a sua doença e vejo que tem uma parcela da minha dedicação envolvida nisso, é uma gratificação muito grande e é isso que nos move."
Jônatas Valentim aproveitou para fazer um apelo a todos que durante esse período podem aproveitar o isolamento social e ficar em casa:
"Quem puder ficar em casa, fica, mas fica de verdade. Mantenha-se hidratado, se alimente bem e com qualidade e mantenha o sistema imunológico em dia, se necessário, com suplementação alimentar e/ou ingestão extra de vitamina C. Nunca foi tão fácil vencer uma guerra, fica em casa!"
Trabalhador autônomo mantém rotina para garantir salário
"Não tem muita escolha, temos que ir pra rua e encarar essa pandemia,
esse risco de frente e se prevenir da melhor maneira possível",
Fernando Moares (Foto: Arquivo Pessoal)
O transportador autônomo, Fernando Moraes, também segue com seu trabalho durante a quarentena. Ele conta que em meio a essa crise não tem como deixar de exercer sua atividade, caso contrário ficará sem receber seu salário.
"O meu trabalho ter sido considerado essencial me garantiu a possibilidade de poder continuar trabalhando e recebendo por isso. Mas em relação aos fretes diminuiu muito. Tem muito lugares fechados, algumas indústrias também não estão operando, e com isso diminuiu a quantidade de carga disponível. Se eu carregava 5/6 vezes na semana, hoje tô carregando 2/3 vezes", relatou.
Apesar da queda na quantidade de trabalho e, consequentemente, em sua remuneração, Fernando reconhece sua vantagem em relação a colegas que não conseguem trabalhar. "Tenho colegas que já estão a 40 dias parados."
Fernando tem uma mãe já idosa e é ele quem a ajuda com as tarefas do dia a dia, como ir ao mercado e receber a aposentadoria. "Ela está em isolamento total no apartamento dela. Toda semana eu faço as compras, levo para o apartamento dela, mas evito me aproximar. Nosso contato maior é por telefone."
A esposa e o filho também ficam em isolamento. Na escola do filho de Fernando foi desenvolvido um aplicativo e durante o período de aula a criança estuda pelo computador. "Nesse aspecto eu fico mais tranquilo, porque eles estão em casa e seguros", disse.
Para evitar uma possível contaminação dentro de casa, o transportador autônomo, sempre que chega da rua, tira as roupas usadas na varanda e vai direto para o banho. Celular, chaves e carteira são limpos com álcool.
O contato com outras pessoas fica restrito, apenas, ao momento do trabalho. Mesmo assim, o profissional conta que procura atender às medidas determinadas pelo Ministério da Saúde, conforme citado acima.
Manter o equilíbrio emocional é um desafio. Fernando relatou que lidar com as notícias sobre número de infectados aumentando a cada dia é assustador. Em contrapartida, é preciso trabalhar para garantir o próprio sustento. Fernando ainda falou sobre a importância do isolamento social:
"Só vamos conseguir neutralizar a expansão desse vírus se nos isolarmos, porque não existe uma vacina ou medicação 100% eficaz para combater. As pessoas que têm a possibilidade de ficar em casa precisam manter o isolamento para resguardar sua saúde e dos que têm contato com elas, especialmente as do grupo de risco".
Motorista tenta orientar cidadãos sobre a importância do isolamento
"Tentamos muitas vezes ajudar as pessoas orientando, mas acaba
não sendo bem recebido", Eduardo Guedes.
(Foto: Arquivo Pessoal)
Para o motorista Eduardo Guedes enfrentar a pandemia não está sendo fácil. Eduardo relatou que sua preocupação se estende a colegas e outras pessoas com as quais tem convívio, principalmente os idosos. No ônibus, tenta orientar as pessoas do grupo de risco sobre a importância delas ficarem em casa, mas em muitos casos recebe como resposta, ofensas.
O motorista afirmou que trabalha apreensivo e tem redobrado os cuidados com a higiene. Todos os itens usados na proteção são comprados com dinheiro do próprio bolso. Uma preocupação é o contato com as pessoas na hora de receber o valor da passagem em dinheiro ou dar trocos, por exemplo.
Falar com a mãe e os irmãos tem sido só por telefone ou pelo portão de casa. O único contato é com a esposa. "É Complicado, porque sinto saudade de almoçar com a minha mãe e de reunir a família", contou.
Eduardo já passou pela experiência de perder amigos para a Covid-19. E essas notícias são as mais difícil de lidar na hora do trabalho.
"Psicologicamente eu fico um pouco abalado e começa a cair a ficha sobre a realidade. Quando começa a morrer pessoas próximas a você, isso te afeta e você já começa a trabalhar com medo e mais estressado."
Além disso, a desvalorização da profissão e os assaltos sofridos nesse período também abalam não só Eduardo como os demais profissionais da categoria.
O motorista lamentou sobre a quantidade de idosos na rua, além de outras pessoas que têm condições de ficar em casa. Eduardo fez um alerta: "fiquem em casa e, se precisa sair, tome as precauções necessárias. Usem a máscara e o álcool em gel, para se prevenirem o máximo que puderem".