Guardiões do Crivella chegam a ganhar dez vezes mais que servidor

Esquema chamado Guardiões do Crivella aponta valores pagos de até dez vezes o salário de um servidor da SMS Rio. Entenda!

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Publicado em:02/09/2020 às 18:15
Atualizado em:02/09/2020 às 18:15

Quanto ganha um servidor público de um hospital municipal do Rio? Um esquema revelado no início desta semana, pelo RJ2 da TV Globo, apontou que bem menos do que os chamados "Guardiões do Crivella". 

De acordo com a reportagem, pessoas contratadas pela Prefeitura do Rio de Janeiro, com cargos em comissão, obtinham ganhos de até R$18 mil para atrapalharem o trabalho da imprensa na porta dos hospitais públicos. 

O valor pode ser até dez vezes maior comparado ao do salário do servidor municipal.

No concurso da Secretaria Municipal de Saúde realizado em 2019, por exemplo, ao cargo de auxiliar de enfermagem a remuneração inicial paga era de R$1.833,31, já somados benefícios.

Já o técnico de enfermagem teve neste edital a remuneração inicial de R$2.163,40 e o enfermeiro R$2.751,39. 

→ Veja o que diz o edital do concurso SMS Rio 2019

Cargos em comissão, também chamados de cargo de confiança, são cargos de livre provimento e exoneração que não necessitam de concurso público. 


Enquanto isso, o apontado como líder no esquema de "guardiões" recebia, em cargo especial, a remuneração de R$18.513,78. Aos demais contratados eram pagos valores variantes entre R$7mil e R$1,6 mil. Todos os valores são pagos com verbas públicas.

Advogado comenta caso e critica discrepância de valores

A pedido da Folha Dirigida, o advogado Sérgio Camargo, especializado em concursos públicos, comentou o caso.

Ele explica que há a jurisprudência do STJ, em que o profissional aprovado para outro cargo poderia desempenhar uma tarefa dentro de uma outra área e receber um valor a mais.

Porém afirma que não é este o caso exposto. 

"Estamos tratando muito possivelmente de uma tentativa pouquíssimo democrática de se evitar que a população se insurja contra a má prestação de serviços perante comissionados ou não, não importa quem recebe este tipo de acréscimo que eleva a remuneração a R$7 mil, R$8 mil, enquanto que o enfermeiro no hospital diante de uma grande pandemia, sem recurso necessário para atender a população, está ganhando bastante menos". 

Sérgio Camargo complementa dizendo que "essa parametração da administração pública ao bel-prazer está ficando insustentável dentro de um Estado Democrático de Direito".

"Ou seja, esses funcionários estão lá sem concurso público para simplesmente serem protetores de uma ideia de governo que não existe. Impedindo as pessoas de falarem com a imprensa, de se manifestarem, manifestarem seu desgosto perante os serviços de saúde, por exemplo". 

Para o advogado, a situação é realmente temerária.

"Dentro de uma cidade que já vive um ambiente de milícia, que agora tá sendo parametrada pelo próprio poder público. Espero que os órgãos atinentes, Defensoria, Ministério Público e a própria OAB se posicionem com o objetivo de impedir que se utilize o desvio de função de servidores, ou que se alcancem pessoas em cargos comissionados, para na prática se exercer a função de protetor do nome do prefeito". 

Polícia Civil e MPRJ investigam "Guardiões do Crivella"

Na última terça-feira, 1º, a Polícia Civil RJ realizou a chamada Operação Freedom, que investiga o caso.

Foram expedidos nove mandados de busca e apreensão aos funcionários ligados ao esquema, incluindo o assessor especial do gabinete do prefeito Marcelo Crivella, Marcos Paulo de Oliveira Luciano (o ML) apontado como organizador do grupo.

Com ele, os agentes da PC RJ apreenderam notebooks, celular, dinheiro, cheques, contratos e um pacote escrito "Crivella".

Como apontou a reportagem do G1, Marcos Paulo de Oliveira Luciano, o ML, é assessor especial do gabinete do prefeito desde 2017 e ganhava em julho R$10,5 mil.

Marcelo Crivella (Foto: Tânia Rêgo/ Agência Brasil)
Autoridades investigam esquema
chamado Guardiões do Crivella 
(Foto: Tânia Rêgo/ Agência Brasil)


O Ministério Público do Rio de Janeiro também abriu um inquérito e pediu ao prefeito Marcelo Crivella explicações sobre o caso.

Diferentes crimes serão avaliados, como associação criminosa e constrangimento ilegal, previstos no artigo 288 e 146 do Código Penal e prática da conduta criminosa do artigo 1º, inciso II do decreto lei 201/67, que trata da responsabilidade de prefeitos.

Em nota, o MPRJ informa que:

"(...) além do ofício ao prefeito Marcelo Crivella, foram expedidos ofícios a secretários municipais, ao Procurador Geral do Município e a outros agentes públicos municipais, para que relatem se têm conhecimento da existência do grupo “Guardiões do Crivella” ou dos demais grupos mencionados e se integram e/ou participam dos grupos, esclarecendo ainda quais são as atividades desempenhadas pela rede de servidores.

Os demais agentes públicos mencionados nas matérias jornalísticas também serão notificados pelo MPRJ para prestar esclarecimentos sobre sua atuação".