OAB repudia sentença de juíza que citou raça em condenação
O presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, manifestou repúdio em relação ao argumento utilizado na sentença e pediu investigação.
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Publicado em:14/08/2020 às 05:20
Atualizado em:14/08/2020 às 05:20
Nesta semana, ganhou repercussão o caso da juíza que mencionou a raça de um réu numa sentença de condenação.
A magistrada Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, afirmou em sua decisão que o homem "seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta".
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, manifestou repúdio em relação ao argumento utilizado na sentença. Segundo ele, a conduta da magistrada precisa ser investigada.
“É inadmissível, inconcebível, o que aconteceu nesse caso. Racismo é crime inafiançável, e o código de ética da Magistratura é claro no seu artigo 9º, ao vedar ao magistrado qualquer espécie de injustificada discriminação. A advogada que tornou público esse absurdo merece parabéns. A OAB faz esta representação ao CNJ porque a conduta da magistrada precisa ser investigada”, disse Santa Cruz.
A OAB Nacional disse que, ao longo do dia, buscou esclarecimentos e solução sobre o caso. Em nota oficial, a OAB-PR classificou a manifestação da juíza como algo que vai na contramão do princípio constitucional da igualdade e da não discriminação.
“Cor e raça não definem caráter e jamais podem ser utilizadas para fundamentação de sentença, notadamente na dosimetria da pena. A humanidade deve caminhar no sentido da eliminação de todos os preconceitos, especialmente os relacionados à origem, raça e cor, pois somente assim alcançaremos o ideal de uma sociedade livre, justa, fraterna, igualitária e solidária”, diz trecho da nota.
Entenda o caso
O caso é sobre a condenação de sete pessoas por organização criminosa acusadas de assaltar e roubar aparelhos celulares no centro de Curitiba. Entre eles está Natan Vieira da Paz, de 42 anos, que foi condenado em primeira instância a pena de 14 anos e dois meses de prisão.
O trecho que menciona a raça de Natan aparece no momento em que a magistrada aplica a dosimetria da pena - que é o cálculo feito para definir a pena. Na condenação, a juíza chegou a mencionar três vezes a raça de um dos réus.
"Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente (sic)", disse a magistrada.
Pelo crime de organização criminosa, o homem teve a pena fixa elevada devido a sua "conduta social". Porém, no mesmo documento, a juíza relatou que Natan é réu primário e que "nada se sabe" da sua "conduta social".
A defesa de Natan disse que vai recorrer à decisão. Segundo a advogada Thayse Pozzobon, a juíza usou a justificativa racial para aumentar a pena do réu. "Ela aumentou em sete meses a pena dele em razão dessa circunstância", afirmou.
Nesta quarta-feira, 12, a juíza emitiu uma nota em que pede "sinceras desculpas" e diz que a frase foi retirada de contexto. No mesmo dia, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que a Corregedoria Geral da Justiça do Paraná investigue o caso.