De acordo com estudo divulgado pela Distrito, hub de inovação que monitora os movimentos do setor de startups, 2020 será, de longe, o ano mais representativo em termos de investimentos recebidos por empresas com esse perfil. De janeiro a setembro já aconteceram 100 aquisições de startups e mais de 300 aportes foram realizados nessas organizações totalizando U﹩ 2,2 bilhões de recursos destinados ao setor.
Se outrora esse movimento era irrelevante para a economia, atualmente, empresas como Ifood, Nubank e Mercado Livre contam em seus quadros de colaboradores com mais de 2.000 funcionários em uma escalada de crescimento galopante.
O que salta aos olhos é que o principal gargalo para o crescimento dessas empresas é justamente a carência de profissionais para ocuparem inúmeras vagas de emprego que se mantém em aberto durante meses seguidos.
O que está por trás dessa assimetria onde de um lado temos um universo que chega à casa de milhões de desempregados e do outro inúmeras vagas em aberto?
Não é necessário amparar-se por pesquisas sofisticadas ou um preparo intelectual muito sofisticado para concluir que na essência dessa contradição está a falta de preparo dos indivíduos disponíveis.
Se faz necessário, no entanto, ir além dessa óbvia constatação e buscar entender a causa raiz desse problema: nosso sistema educacional não acompanhou a velocidade das demandas do mercado. A esmagadora maioria das universidades continua ensinando os mesmos conteúdos existentes há décadas com ementas obsoletas e desassociadas da realidade atual dos negócios.
Importante estar claro que esse é um desafio global. Na obra "Gestão do Amanhã", de minha autoria com José Salibi Neto, realizamos uma pesquisa para avaliar a formação acadêmica dos líderes a frente das organizações mais representativas da atualidade.
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Analisamos o currículo dos fundadores da Apple, Facebook, Microsoft, Uber, Amazon, Airbnb, Tesla e Youtube. Observe que nesse universo se encontram 4 das 5 empresas mais valiosas do planeta. Qual não foi nossa surpresa ao identificar que nenhum deles é formado em Administração.
Encontramos Engenheiros, Designers, Matemáticos, Físicos, Psicólogos, enfim, um leque diversificado de formações acadêmicas. Só não encontramos um Administrador. A pergunta que não quer calar é: se as principais instituições de Administração do mundo não estão formando os líderes da nova era, elas estão fazendo o que?
Não estou fazendo uma apologia à redução da importância do universo acadêmico na evolução da sociedade e do ambiente corporativo. Pelo contrário, é sabido e até soa como uma premissa gasta e surrada que a educação é um dos principais vetores de desenvolvimento da sociedade.
O ponto que demanda uma reflexão que não está sendo realizada com a seriedade e profundidade devida diz respeito à revisão geral e irrestrita de todos as ementas e programas atuais adotados pelas instituições que se dedicam ao ensino das mais variadas matrizes da gestão organizacional.
A solução para redução dessa assimetria entre pessoas desempregadas e vagas em aberto passa, irremediavelmente, pela aproximação definitiva da academia com o mercado corporativo. Tradicionalmente, esses dois sistemas atuaram de forma autônoma no Brasil a despeito de sua óbvia integração.
É assustador avaliarmos as descrições das teses produzidas anualmente nos principais Mestrados de Administração no país. Elas evidenciam uma desassociação desproporcional desses dois sistemas com abordagens distantes das demandas do mercado.
Não devemos concentrar essa análise exclusivamente nos agentes públicos - a despeito de reconhecer que qualquer solução passa por esse contexto. Essa inquietude deve estar no centro das reflexões das instituições acadêmicas privadas cujo ambiente, em geral, se caracteriza por um maior dinamismo e agilidade.
Enquanto não atuarmos na causa raiz implodindo as barreiras que segregam as instituições de ensino da esfera organizacional, continuaremos refém dessa lógica perversa que só tende a se acentuar devido ao avanço tecnológico e a eminente processo de transformação do trabalho com a substituição da mão de obra humana pela tecnologia em alguns ofícios tradicionais.
A revisão dos conteúdos educacionais sobre gestão deve ser pautadas e dirigidas pelas demandas do ambiente organizacional e toda produção acadêmica canalizada para resolver problemas reais que impactam decisivamente a produtividade das empresas atualmente. Essa é uma decisão eminente que não pode ser postergada.
O mundo passa por uma transformação sem precedentes na história da humanidade. Ter a humildade de se reinventar adaptando-se a essa nova era é um imperativo para sobreviver e prosperar em dias cada vez mais turbulentos. Resta saber se os líderes do ambiente acadêmico estão dispostos a confrontar suas crenças e se transformar na velocidade requerida.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Folha Dirigida.

Sobre o autor
Sandro Magaldi é especialista em gestão de negócios e autor de seis livros de negócios, entre eles, Estratégia Adaptativa lançado, recentemente, em parceria com José Salibi Neto.