Receita Federal atrapalha o desenvolvimento do país? Checamos!

Entenda como funciona o trabalho dos auditores fiscais e a importância da fiscalização feita pela Receita Federal.

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Publicado em:06/03/2020 às 09:41
Atualizado em:06/03/2020 às 09:41

Na noite da última quinta-feira, dia 5, o presidente Jair Bolsonaro deu uma declaração polêmica. Segundo ele, "a Receita Federal atrapalha o desenvolvimento do Brasil em algumas áreas".

A fala foi registrada durante uma live realizada no perfil de Bolsonaro, no Facebook. No mesmo dia o presidente esteve em um encontro com empresários na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Além de Bolsonaro, participaram do encontro mais seis ministros — entre eles Paulo Guedes —, 40 acionistas, chairmans e CEOs dos maiores grupos empresariais do país.

De acordo com o presidente, durante o encontro ele ouviu pleitos, por parte dos empresários, sobre questões que são de competência do governo federal resolver. Bolsonaro prosseguiu, dizendo que o ministro Paulo Guedes chegou a ficar assustado com o diagnóstico a eles apresentado.

"Fomos lá para ouvir os empresários. Aí ouvimos muitas coisas que compete a nós resolver, que são decretos presidenciais, portarias dos ministérios e, também, normas da Receita Federal. É impressionante. O Paulo Guedes ficou até meio assustado, né? Como a Receita atrapalha em algumas áreas o desenvolvimento do Brasil. É coisa terrível a burocracia, terrível", disse Bolsonaro.

O Presidente comentou ainda sobre a questão do PIB. Segundo ele, durante a reunião da Fiesp, o ministro Paulo Guedes explicou aos empresários que no último trimestre, o PIB cresceu 1,7% com maior participação do setor privado, que do setor público.

De acordo com Bolsonaro, o resultado do atual PIB reflete os altos e baixos dos últimos anos. No governo Dilma Rousseff, por exemplo, foram dois anos consecutivos de saldos negativos, em 2015 e 2016.

"Gostaríamos que não fosse negativo. No primeiro governo Temer já deu uma recuperada passou de -3,3%, para 1,3%. Foi um crescimento de 4,6%, não é crescimento é diferença, do negativo para o positivo dá 4,6%. No segundo governo Temer deu 1,3%. O nosso deu 1,1%", explicou.


Receita Federal atrasa o Brasil? Entenda!

Em sua crítica à Receita, Bolsonaro fez referência à burocracia de alguns processos, porém não entrou em detalhes sobre o assunto. No entanto, os resultados da Receita Federal em arrecadação nos últimos anos contradizem a fala do presidente. A arrecadação federal em 2019 foi a maior em cinco anos. 

Durante o primeiro ano da gestão de Jair Bolsonaro foram arrecadados 1,537 trilhão. O número é 1,69% maior em relação ao ano de 2018. Entre os principais fatores que contribuíram para esse aumento estão a alta na venda de bens e comercialização de serviços.

Tal resultado também é fruto da eficiência do trabalho dos auditores fiscais, com a fiscalização.Segundo dados do Plano Anual de Fiscalização para 2019, disponível no site da Receita Federal, o montante de crédito tributário recuperado pela fiscalização em 2018 foi de R$ 186,93 bilhões. O valor supera em 25,1% a estimativa de lançamentos de ofício para o ano, que era de R$ 149,34 bilhões.

Já em relação a estratégia plurianual dos últimos quatro anos, em relação ao período anterior, o aumento foi de 15,84% nas autuações da Receita. Em 2018 foram registrados, ainda, 345.926 procedimentos fiscais executados. As expectativas é que esses percentuais continuem em crescimento nos próximos anos. O Plano referente ao ano de 2020 deve ser publicado nos próximos meses.

Receita Federal
Apesar do déficit e orçamento limitado, Receita continua apresentando dados
positivos em arrecadação (Foto: Divulgação)


O que faz um auditor fiscal da Receita federal?

O trabalho de fiscalização conduzido pelos auditores fiscais da Receita Federal, basicamente, funciona como controle sobre os impostos pagos por pessoas físicas e empresas. Dentre as atribuições desses profissionais estão:

  • Participações em processo administrativo-fiscal, como processos de consulta, restituição ou compensação de tributos e contribuições; 
  • Execução de procedimentos de fiscalização, inclusive os relacionados com o controle aduaneiro, apreensão de mercadorias, livros, documentos, materiais, equipamentos e assemelhados; 
  • Análise da contabilidade de sociedades empresariais, empresários, órgãos, entidades, fundos e demais contribuintes;
  • Entre outras atividades;
     

Os profissionais são contratados por meio de concursos públicos. Para concorrer, é preciso ter graduação em qualquer área. As remunerações chegam a R$21.487,09. 

Quanto estes profissionais ajudam na fiscalização?

Os auditores da receita não ficam limitados, apenas às questões tributárias. A Receita atende demandas relacionadas a diferentes áreas. Alguns auditores podem atuar nas atividades de repressão ao contrabando, por exemplo, nas fronteiras do país ou investigações sobre crimes de lavagem de dinheiro.

Também integram as atribuições de um auditor fiscal as seguintes tarefas:

  • Aeroportos: liberação de passageiros e de suas bagagens — além de liberação de importações e exportações nos portos;
  • Segurança: apreensão de drogas, controle aduaneiro, apreensão de armas, munições e combate contra o contrabando. Para isso, são utilizados alguns recursos, como scanners, cães de faro, etc, além dos servidores capacitados para esse tipo de ação.

 

Conforme especificado no próprio site da Receita Federal, o órgão atua, ainda, em outras atividades, como:

  • Aplicação e elaboração de propostas para o aperfeiçoamento da legislação tributária e aduaneira federal;
  • Formulação da política tributária e aduaneira;
  • Elaboração do orçamento de receitas e benefícios tributários da União;
  • Interação com o cidadão por meio dos diversos canais de atendimento, presencial ou a distância;
  • Educação fiscal para o exercício da cidadania;
  • Formulação e gestão da política de informações econômico-fiscais;
  • Promoção da integração com órgãos públicos e privados afins, mediante convênios para permuta de informações, métodos e técnicas de ação fiscal e para a racionalização de atividades, inclusive com a delegação de competência;
  • Atuação na cooperação internacional e na negociação e implementação de acordos internacionais em matéria tributária e aduaneira.

 

A carência desses profissionais no quadro de servidores da Receita Federal pode provocar consequências negativas para o país, como atraso na análise dos processos de restituição, do despacho aduaneiro de mercadorias e, ainda, na analise das declarações de Imposto de Renda.

A Receita Federal do Brasil é dividida em dez regiões fiscais, cada uma com diversas unidades: delegacias, alfândegas, inspetorias, agências, superintendências, entre outras. Cada uma responsável por diferentes demandas.

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Órgão fez nova solicitação de concurso em 2019

Em agosto de 2019, a Receita havia solicitado ao Ministério da Economia novos pedidos de concurso, com 3.314 vagas. Desse total, 2.153 são para o concurso da própria Receita e outras 1.161 para concurso da Secretaria de Fazenda. 

Das 2.153 vagas destinadas à Receita, 1.453 são para o cargo de analista-tributário e 700 para auditor-fiscal. O cargo de analista também exige o nível superior completo, em qualquer área. A remuneração, nesse caso, é de R$12.142,39. 

O déficit no órgão é preocupante. A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) revelou, em janeiro deste ano, que o órgão já acumula mais de 21 mil cargos vagos.

De acordo com a nota publicada pela associação, a Coordenação de Gestão de Pessoas da Receita Federal apontou um total de 21.471 cargos vagos. Destes, 11.325 são de auditores fiscais e 10.416 são de analistas. 

"Na contramão da fiscalização, o número de empresas no Brasil não para de crescer. Segundo dados oficiais da RFB, houve um aumento de 17,4% (1.545.242) no número de empresas abertas no primeiro semestre do ano passado comparado ao mesmo período de 2018, quando foram registrados 1.315.151 novas empresas", diz a Anfip.

Numa tentativa de amenizar o déficit. o secretário especial da RFB, José Barroso Tostes, destinou vagas à reversão de inativos para o ano de 2020. Desta forma, 50 auditores-fiscais e 50 analistas-tributários aposentados voltarão ao serviço ainda este ano.

+ Concurso Receita 2020: déficit prejudica fiscalização nas fronteiras


Receita sofreu corte expressivo no orçamento para 2020

Além disso, o órgão sofreu um corte de R$1 bilhão no orçamento para 2020. A limitação dos recursos vai comprometer atividades da Receita em 117 Delegacias, 30 Alfândegas, 42 Inspetorias, 327 Agências e 25 Postos de Atendimento, podendo algumas delas serem fechadas ao longo do ano.

De acordo com o SindiReceita, o corte de 36% no orçamento afetará atividades do órgão, que é responsável por garantir a arrecadação, a segurança e agilidade no fluxo internacional de bens, mercadorias e viajantes. Além de contribuir para a melhoria do ambiente de negócios e da competitividade do país. 

No entanto, os maiores prejudicados serão os contribuintes. O calendário de liberação das restituições do IRPF e das declarações retidas em malha pode não ser cumprido em 2020. Os cortes podem afetar a entrega de outras declarações e o processamento dessas informações. 

+ Sem concurso da Receita Federal, órgão pode ter unidades fechadas

No dia 5 de janeiro, o subsecretário de Gestão Corporativa da Receita Federal, Moacyr Mondardo, se reuniu com membros da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) para discutir o andamento do projeto de reestruturação do órgão. O projeto é fundamental para que o concurso Receita Federal saia do papel.

O plano para este ano é que o decreto com a definição de cargos e o regimento, com as competências, estejam em vigor a partir de 1º de junho de 2020. O prazo considera o fato de que as atualizações de movimentação no sistema são demoradas.

Também foi discutida na reunião a implementação de um ponto eletrônico para auditores fiscais da Receita. Moacyr Mondardo disse que ainda não há uma posição concreta sobre o assunto.

No entanto, o subsecretário afirmou que estão em discussão questões sobre teletrabalho e regulamentação do trabalho semipresencial. Além disso, a situação dos supervisores de equipes e os que exercem o trabalho externo é debatida.

 "É uma questão complexa e a variabilidade do trabalho da fiscalização é extrema", disse o subsecretário.


Último concurso Receita Federal foi realizado há seis anos 

O último concurso Receita Federal foi realizado em 2014 e ofereceu 278 vagas para auditor-fiscal. A função exige o nível superior em qualquer área. A remuneração para a carreira era de R$15.338,44, incluindo o valor do auxílio-alimentação, de R$373.

O concurso foi nacional, podendo a lotação ser escolhida pelos aprovados. As inscrições foram aceitas por meio da Escola de Administração Fazendária (Esaf) e os candidatos foram avaliados por meio de provas objetivas, contendo 70 questões, e discursivas.

O exame de múltipla escolha incluiu perguntas de: Língua Portuguesa, Espanhol ou Inglês, Raciocínio Lógico, Administração Geral e Pública, Direito (Constitucional, Administrativo e Tributário), Auditoria, Contabilidade Geral e Avançada, Legislação Tributária e Comércio Internacional e Legislação Aduaneira.

Foram convocados para a sindicância de vida pregressa apenas os candidatos que alcançaram, nas provas objetivas, 40% ou mais dos pontos de cada disciplina e 60% ou mais da pontuação total do conjunto das provas, além de, pelo menos, 60% dos pontos totais da etapa discursiva.