Quais os direitos dos profissionais PcD durante a pandemia?
A especialista Dominique Fialho fala sobre direitos da pessoa com deficiência e dá dicas de como ser uma empresa mais inclusiva na contratação de PcDs
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Publicado em:01/09/2020 às 12:00
Atualizado em:01/09/2020 às 12:00
De acordo com o último censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui mais de 45 milhões de Pessoas com Deficiência (PcD). O número representa cerca de 24% da população do país.
Nos últimos anos, o mercado de trabalho passou a oferecer mais vagas para esses profissionais. Segundo a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), em 2016, o país já contava com cerca de 400 mil PcDs empregados.
Você sabe quais os direitos desses trabalhadores durante a crise provocada pela pandemia do Coronavírus?
No dia 7 de julho, foi publicada a Lei nº 14.020 que, entre outras medidas, proíbe a dispensa sem justa causa dos trabalhadores com deficiência durante o período de pandemia causada pelo vírus da Covid-19. Além disso, as empresas também não poderão diminuir a cota da contratação, pois não há lei que permite tal atitude.
Dominique Fialho, advogada especialista em direito da pessoa com deficiência, explica que o artigo 7 da Lei nº 14.020 estabelece a possibilidade da redução de jornada e salários durante o período de pandemia, além da suspensão temporária de contrato.
"O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) esclarece que, a princípio, essa redução poderá ser de 25%, 50% ou 70% da jornada e do salário do trabalhador, a vigorar por um prazo máximo de 90 dias", diz a advogada.
Uma das medidas adotadas para conter a disseminação do Coronavírus foi o isolamento social. Por conta disso, muitas empresas estabeleceram o trabalho remoto, ou home office, aos seus colaboradores.
No caso dos profissionais PcDs que passaram a exercer suas atividades remotamente, Dominique ressalta que uma opção pode ser a empresa deslocar os móveis adaptados para a casa do colaborador neste período ou até mesmo ajudá-lo a adaptar seu próprio ambiente caseiro da melhor forma.
A especialista cita o exemplo de pessoas com autismo, que podem fazer um bom uso do home office sem ter que lidar com as conturbações do deslocamento até o trabalho. No entanto, a empresa também precisa pensar na produtividade desses profissionais, já que barulhos e distrações como obras, movimentação de vizinhos e na rua, podem desconcentrá-los constantemente quando precisam trabalhar de forma constante.
Quais os direitos da pessoa com deficiência no mercado de trabalho?
Segundo Dominique, a principal intenção da Lei de Cotas (Lei 8.213/1991) é reconhecer as melhores oportunidades de emprego para pessoas com deficiência. Isso porque, sem um conjunto de políticas afirmativas, sua colocação no mundo corporativo torna-se cada vez mais difícil.
De acordo com a lei, empresas com 100 ou mais funcionários devem reservar de 2% a 5% dos seus cargos a beneficiários reabilitados ou PcDs, habilitadas, na seguinte proporção:
até 200 empregados: 2%;
de 201 a 500: 3%;
de 501 a 1 mil: 4%;
de 1.001 em diante: 5%.
Dentre os principais direitos do trabalhador PcD no mercado de trabalho, a especialista destaca os seguintes:
Jornada especial de trabalho
A remuneração deve ser compatível com a jornada de trabalho realizada por cada profissional, variando de acordo com a necessidade de cada um. Se a deficiência apresentada pelo empregado exigir algum tipo de redução ou flexibilização do horário, a empresa contratante será obrigada por lei a liberá-lo. Porém, ele receberá um
salário proporcional às horas trabalhadas.
Igualdade salarial
A lei garante aos trabalhadores com deficiência a inexistência de desigualdade no salário, desde que a função realizada seja compatível com a dos outros funcionários da empresa. Se existir alguma diferença na remuneração, isso será caracterizado como uma prática ilícita e discriminatória.
Estabilidade
O trabalhador com deficiência só poderá ser dispensado sem justa causa mediante a contratação de um substituto em condições semelhantes. E que esteja em regime de contrato determinado, superior a 90 dias, ou indeterminado.
"É importante lembrar que o trabalhador PcD conta, ainda, com uma reserva de cargos e empregos em concursos públicos, garantia de habilitação e reabilitação profissional, tarefas e rotinas adequadas às suas peculiaridades. Além de adaptações do ambiente físico de trabalho, dependências e equipamentos, a fim de garantir melhor acessibilidade em suas funções."
Como promover inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho?
Apesar dos avanços na disponibilização de vagas para pessoas com deficiência, Dominique ressalta que o trabalhador PcD precisa ter acesso à acessibilidade desde o momento que deixa sua residência até o local de trabalho, e a empresa deve se certificar de que isso ocorre.
"Não adianta apenas ter um local de trabalho acessível (...) A comunicação utilizada, métodos e ferramentas para realizar determinada função e também o comportamento das pessoas — tanto dos PcD quanto dos outros colaboradores — são aspectos fundamentais que a empresa deve adaptar. Tenha um plano de carreira que aproveite suas qualificações e faça-os sentirem valorizados e importantes, pois é de extrema importância para a produtividade de qualquer funcionário."
Além da reserva de vagas em processos seletivos, Dominique conta que para se tornar mais inclusiva, a empresa deve garantir a acessibilidade ao candidato a todo o momento, inclusive na logística de locomoção até o local da entrevista.
Ter um banco de currículo confiável e verba para contratar uma consultoria também são pontos a serem levados em consideração, segundo Dominique. Para a especialista, é importante obter o apoio da liderança da empresa para preencher essas vagas e, além disso, é necessário que os recrutadores consigam passar exatamente o trabalho a ser desempenhado pelo candidato PcD.
"Entenda a deficiência do seu futuro trabalhador, para que consiga também providenciar as ferramentas e a metodologia a ser usada por ele", destaca.
"O que não falta é mão de obra dentro deste perfil. Dos 45 milhões com deficiência, 66% são economicamente ativos e 21% têm ensino médio completo. A cota deveria contemplar 2% desse público, mas só contempla 0,9% com carteira assinada. Ainda estamos muito longe de ter espaços totalmente acessíveis, nas ruas, nos órgãos públicas, nas empresas. Uma das ferramentas para lei ser cumprida é a fiscalização, o que melhoraria bastante se acessibilidade plena fosse garantida. É indispensável a conscientização das empresas, mostrando que são colaboradores extremamente capazes e que podem exercer sua função com eficiência."