Câmara aprova reserva de vagas para negros nos concursos de Niterói
A Câmara Municipal de Niterói aprovou com unanimidade o projeto de lei para reserva de vagas para negros e pardos em concursos públicos.
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Publicado em:13/07/2020 às 13:25
Atualizado em:13/07/2020 às 13:25
Após anos de espera, a Câmara Municipal de Niterói aprovou o Projeto de Lei que dispõe sobre a reserva de vagas para negros e pardos em concursos públicos. A proposta já havia sido indicada anos antes no artigo n°16 da Lei 3110/2014, o Estatuto da Igualdade Racial da cidade, que descrevia:
“Poderá ser estabelecida no Município, através de Lei de iniciativa do Executivo, legislação que obriga os editais para concurso público da administração direta ou indireta a cota de 20% das vagas destinadas aos que se declarem negros.”
No entanto, a proposta só foi aprovada em votação na Câmara no último dia 9 de julho. O autor do projeto é o prefeito da cidade de Niterói, Rodrigo Neves. A aprovação foi unânime entre os parlamentares, com 14 votos favoráveis.
O próximo passo é a sanção do projeto, que deverá ser publicada em Diário Oficial. O PL tem como objetivo estabelecer normas relacionadas à política de cotas, seja racial ou social. De acordo com o texto da proposta, as cotas têm como finalidade a inclusão de grupos discriminados racialmente no mercado de trabalho.
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Levantamento aponta que renda familiar está relacionada à questão racial
O texto ainda cita um estudo realizado pela organização social Bem TV², em parceria com a UFRJ, que reforça a necessidade de equilibrar as condições de participação de pessoas negras em concursos públicos.
Isso porque de acordo com o levantamento, a cor da pele está intrinsicamente associada à renda familiar, especialmente quando estamos falando da população mais jovem. No estudo, foram consideradas as cidades de São Gonçalo e Niterói.
“Em São Gonçalo, onde a juventude é predominantemente negra (pretos + pardos), ela é também predominantemente mais pobre. Já em Niterói, onde a renda familiar é mais alta, a juventude é majoritariamente branca.”
Segundo o estudo, os dados não são coincidência. Ao contrário, revelam uma tendência nacional, justificada por meio de dados do IBGE:
“De acordo com o IBGE, em 2015, entre os 1% mais rico da população brasileira, 79% eram brancos. Por outro lado, no grupo 10% mais pobre os negros são maioria, equivalendo a 73,2% do total (BRASIL, IBGE, 2015). Logo, o cenário observado em Niterói e São Gonçalo corrobora para a percepção de que, no Brasil, a distribuição das riquezas observa forte viés racial.”
Concursos com oferta maior que três vagas deverão ter reserva
Conforme descrito no texto do PL, ficarão reservadas aos negros e pardos 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no Poder Executivo do Município de Niterói e das entidades de sua Administração Indireta.
A reserva será aplicada sempre que o número de vagas oferecidas for maior que três. Se o número de vagas reservadas a negros e pardos for um número decimal igual ou maior do que 0,5, a reserva será equivalente ao número inteiro imediatamente superior. Caso contrário, será adotado o número inteiro imediatamente inferior.
Será considerado negro ou pardo o candidato que assim se declare no momento da inscrição. Serão levados em conta os critérios de raça e cor utilizados pelo IBGE.
Se não houver candidatos negros ou pardos aprovados, as vagas destinadas à reserva serão revertidas para o quadro geral de vagas oferecidas no concurso, podendo ser preenchidas pelos demais candidatos aprovados, obedecida a ordem de classificação.
Já os candidatos negros aprovados dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas.
Autodeclaração será verificada em processo de heteroidentificação
O projeto de lei também prevê regras para casos de declarações falsas. Caso identificada a inveracidade das informações, o candidato será eliminado do concurso, podendo sofrer ação penal.
Se já tiver sido nomeado, o servidor ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço público, após procedimento administrativo. Durante o processo lhe será assegurado o direito à defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.
A veracidade da autodeclaração será avaliada por meio de um processo de heteroidentificação. Em todos os concursos, deverá ser instituída uma comissão formada por quatro integrantes que serão distribuídos por gênero e cor. Estes indicados:
Pela Coordenadoria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Município de Niterói, ou órgão que venham a suceder as atribuições desta;
Pela Câmara Municipal;
Pela Comissão de Igualdade Racial da Subseção de Niterói da OAB/RJ; e
Por entidade da sociedade civil notoriamente atuante na defesa dos direitos de negros e pardos.
Processo de heteroidentificação: mecanismo que visa ao combate e controle de possíveis fraudes na reserva de vagas para pessoas autodeclaradas negras e pardas em concursos públicos.
Candidatos serão submetidos à entrevistas
Durante esta etapa, os candidatos do concurso passarão por uma entrevista. Todo procedimento de verificação será filmado pela organizadora do concurso, para fins de registro de avaliação e será de uso exclusivo da comissão avaliadora.
A comissão avaliadora considerará as características físicas apresentadas pelo candidato na apresentação presencial. Será considerado negro ou pardo o candidato que assim for reconhecido como tal por pelo menos dois dos membros da comissão.
A etapa deverá ser realizada antes do período de curso de formação (quando houver) e antes da publicação do resultado final do concurso. O processo de heteroidentificação deve ser realizado com base em algumas diretrizes, como:
Respeito à dignidade da pessoa humana;
Observância do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal;
Garantia de padronização e de igualdade de tratamento entre os candidatos submetidos ao procedimento de heteroidentificação promovido no mesmo concurso público;
Garantia da publicidade e do controle social do procedimento de heteroidentificação, resguardadas as hipóteses de sigilo;
Atendimento ao dever de autotutela da legalidade pela administração pública; e
Garantia da efetividade da ação afirmativa de reserva de vagas a candidatos negros nos concursos públicos de ingresso no serviço público municipal.
A lei vigorará por dez anos, a partir de sua data de publicação. Esta não será aplicada a concursos que já tenham editais publicados antes da sanção.
Caberá à Coordenadoria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial ( CEPPIR), ou outro órgão com as mesmas atribuições, promover o acompanhamento permanente dos seus resultados e produzir relatório conclusivo a cada dois anos.
Niterói sancionou lei com reajuste salarial de servidores
Ainda no dia 9 de julho, foi publicado no Diário Oficial do Município a Lei 3522/20250, que detalha a revisão geral anual dos servidores públicos. De acordo com a lei, o vencimento base dos cargos de provimento efetivo, bem como os comissionados do Poder Legislativo serão reajustados, a partir de 1º de junho de 2020.
O reajuste ficou em 1,95% e aplica-se aos servidores inativos e aos pensionistas. Também houve alteração nos valores do auxílio transporte e do abono refeição.
Segundo as novas regras, o auxílio transporte passa a ser de R$216, enquanto o abono refeição ficará em R$389. A lei entra já está em vigor desde a data de sua publicação, produzindo efeitos financeiros a partir de 01 de junho de 2020.