Mulheres x Tecnologia: como incluí-las mais nesse mercado?

Segundo dados do IBGE, apenas 20% dos profissionais de TI são mulheres. O desafio é ultrapassar essas barreiras e incluí-las mais no mercado tecnológico

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Publicado em:12/10/2020 às 09:00
Atualizado em:12/10/2020 às 09:00

Por trabalhar na loja de móveis da família desde os 14 anos, Thais de Faria resolveu fazer faculdade de Design de Interiores, mas logo de cara não se identificou com o curso.

Enquanto a maior parte das colegas de turma dela se saiam muito bem em matérias como História do Mobiliário, o forte dela eram as disciplinas como Elétrica e Hidráulica.

Foi então que ela resolveu declinar do negócio da família e fazer a mudança de curso para desenvolvimento de sistemas.

Atualmente backend developer e tech lead na Gupy, ela acredita que tenha tido bons gerentes, mas em diversas vezes já se viu diminuída por ser mulher.

Em uma empresa da indústria Química, sentiu que precisou adotar um comportamento mais masculinizado para se inserir no ambiente machista.

Em outra, ao ser vítima de assédio, ouviu de um colega que até poderia reportar o caso ao RH, mas que nada aconteceria, porque era sempre assim.

“Acho que essas situações acumuladas incomodam e prejudicam seu desenvolvimento, não te permitindo ser quem é e entregar todo o seu potencial. Quando eu estou em uma sala com 22 homens e sou a única mulher, sinto que estou representando toda a minha classe de mulheres, então não posso errar", explica.

Situações parecidas também aconteceram com Eduarda Carvalho, product manager também na Gupy, onde ambas afirmam se sentir confortáveis e bem acolhidas.

Formada em Engenharia Civil, chegou a trabalhar em ambientes prioritariamente masculinos. Ela conta que diversas vezes teve sua voz silenciada ou seus conhecimentos questionados. 

“Quando converso com outras mulheres vejo o quanto o manterrupting é comum”, explica, sobre o termo em inglês que significa ser interrompida por um homem constantemente de maneira desnecessária.

Até em uma disputa por uma vaga de emprego, na qual o outro candidato era bem menos qualificado, apenas ela precisou provar suas capacitações. “Percebi que era pelo fato de ser mulher”, completa.

 

Segundo uma pesquisa realizada pelo IBGE, apenas 20% dos profissionais que atuam no mercado de TI são mulheres (Foto: Freepik)
Apenas 20% dos profissionais que atuam no mercado de TI são mulheres
(Foto: Freepik)

Por que ainda há tão poucas mulheres na tecnologia?

Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 20% dos profissionais que atuam no mercado de TI são mulheres.

Alguns dos desafios que o diretor de Comunicação Corporativa, Diversidade e Sustentabilidade da Via Varejo, Hélio Muniz, associa a essa ausência são:

  • Dificuldade em entrar em um mercado dominado por homens;
  • Provar que seu trabalho tem qualidade igual ao de homens;
  • Conquistar credibilidade;
  • Demonstrar que têm capacidade para gerir projetos e pessoas.

Eduarda Carvalho, por sua vez, remete essa ausência da presença feminina na tecnologia, primeiramente, à infância. Afinal, meninos são muito mais incentivados a interagir com brinquedos que se refiram a máquinas e tecnologia, enquanto meninas têm suas brincadeiras mais voltadas para a casa e para cuidados.

Isso acaba por se estender ao ambiente universitário, quando mulheres sentem que não se sairiam bem em áreas como Engenharia.

Desafios das mulheres na tecnologia

Como incentivar mais mulheres a entrarem no ramo da tecnologia?

A product manager da Gupy acredita que a principal forma seja através da Educação. Ela já foi diversas vezes dar palestras em escolas sobre a sua profissão. Ao final, sempre havia algumas meninas que a procuravam relatando que nunca nem tinham pensado antes em seguir pelo ramo da tecnologia.

Com isso em mente, a Fundação Casas Bahia, braço social da Via Varejo, tem uma parceria com o Instituto PROA, organização sem fins lucrativos, qualificada como OSCIP, que atua na criação de oportunidades de desenvolvimento profissional para jovens mulheres de baixa renda da rede pública de ensino.

Algumas das ideias é que elas tenham orientação no início da carreira profissional e apoio na conquista das primeiras oportunidades de trabalho e estudo, assim conhecendo todas as possibilidades que podem seguir, inclusive na tecnologia.

A iniciativa também é alinhada com alguns dos objetivos da agenda da ONU 2030, entre os quais está:

  • Erradicação da pobreza em todas suas formas e lugares; 
  • Assegurar a educação inclusiva e equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos; 
  • Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas; 
  • Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho decente para todos; 
  • Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles.

Mas não basta garantir apenas que essas mulheres entrem no mercado. Também é necessário que elas permaneçam. Thais de Faria nota que são promovidas várias iniciativas para incentivar a diversidade entre os colaboradores, mas essas campanhas e treinamentos dificilmente se aplicam a quem está no topo.

Outro problema é a falta de mulheres em posições de liderança. Eduarda Carvalho lembra de uma ocasião em que a CEO da Gupy, Mari Dias, fez uma enquete buscando outras CEOs de startups mulheres.

Foram encontradas pouquíssimas em tais posições de liderança, o que na opinião da product manager reforça a condição de um ambiente menos seguro, do ponto de vista psicológico, para as mulheres se arriscarem no segmento.

Algumas das soluções apontadas pelos entrevistados para aumentar o número de mulheres no ramo da tecnologia e tornar a cultura organizacional menos machista foram:

  • Apoiar e promover a qualificação profissional de mulheres desde cedo;
  • Promoção de políticas igualitárias e da equidade de gênero;
  • Dar mais visibilidade, valorizar e enaltecer as mulheres que já estão no mercado da tecnologia como fonte de exemplo e inspiração;
  • Ter mais mulheres em posições de liderança;
  • Aplicar treinamentos relacionados à diversidade também para quem está no topo;
  • Debater a equidade de gênero;
  • Contratar 50% ou mais de mulheres para vagas de emprego;
  • Grupos de apoio para quem está começando, como o “Mulheres de Produto” e “Programaria”;
  • Redes de apoio dentro das empresas;
  • Campanhas para recrutamento específico de mulheres;
  • Projetos para ajudar mulheres a se desenvolver.

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